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Cascudo, um provinciano universal
21 de Outubro de 2015
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Por Yuno Silva
 
“Compreendi a minha vida e vivo a minha vida. Não vivi a vida dos outros. Estudei o que amei. Pesquisei e discuti sobre assuntos que queria escrever. O comum é aparecer uma novidade e o sujeito largar o que está fazendo e fazer a novidade... O segredo da vida está no entendimento”. Esse trecho, pinçado de uma das últimas entrevistas que Câmara Cascudo (1898-1986) concedeu antes de morrer, fecha a linha do tempo criada para a exposição “O Tempo e Eu e Vc” e diz muito sobre sua personalidade. Focado e metódico, Cascudo sabia da grandeza e da relevância de seu trabalho, e mesmo sem ter absoluta certeza já imaginava que seria eternizado por ele. A exposição, aberta esta semana no Museu da Língua Portuguesa em São Paulo, faz um recorte significativo da trajetória do professor, pesquisador, etnógrafo, escritor, jornalista e advogado. 
O único atributo que o intelectual potiguar não fazia questão de ser reconhecido era o de folclorista, apesar de seu nome ser referência nacional no assunto. Estudioso da oralidade, da cultura popular, das tradições e dos costumes dos brasileiros, inclusive alimentares e religiosos, Cascudo deixou uma obra extensa, legado que passou por um filtro antes de ganhar forma e ser apresentada ao público. “O desafio não foi saber o que incluir na mostra, e sim o que poderíamos descartar”, disse Gustavo Wanderley, curador e coordenador geral da mostra que permanece em cartaz até fevereiro de 2016. 
Com toda certeza “O Tempo e Eu e Vc” é a exposição mais completa e interessante já produzida sobre Câmara Cascudo até agora, um momento oportuno para divulgar não só o nome dele para todo o Brasil, como também o RN e Natal como destino turístico e polo cultural – potenciais que precisam ser percebidos pelos gestores públicos e empresários potiguares. Ou seja, é injustificável o não envolvimento de empresas do RN e o apoio quase nulo dispensado pelos governos Estadual e Municipal.
 
Ontem (terça, dia 20) foi o primeiro diz aberto ao público, e nas duas primeiras horas cerca de 20 escolas da rede pública já haviam feito visitas como atividade extracurricular. Próxima semana os estudantes que visitarem Cascudo no Museu da Língua Portuguesa irá levar para casa o Caderno dos Curiosos, onde poderão anotar impressões sobre o cotidiano, desde o que se come ao que se vê, sente e ouve. “A base do trabalho de Cascudo era a observação”, destacou o curador.
A intenção das instituições organizadoras, Ludovicus – Instituto Câmara Cascudo e Casa da Ribeira SP, é colocar a exposição para rodar antes dela desembarcar de vez em Natal em 2017. Wanderley já está em campo buscando recursos para viabilizar a ida da mostra para Curitiba, Rio de Janeiro, Belém, Manaus e Fortaleza.
 
Dividida em cinco momentos: vida e obra, danças e tradições populares, oralidade, alimentação e fé e superstição, a exposição “O Tempo e Eu e Vc” começa já no elevador de acesso, com a trilha sonora que transporta o visitante para o universo da cultura popular.
O próximo passo é o passeio por um labirinto de 20 mil livros que representam a “Babilônia” – apelido dado pelo próprio para designar sua biblioteca pessoal. O labirinto desemboca na ‘estante da vida’, onde estão reunidos objetos que remetem a figura do pesquisador desde sua infância: estão lá a gaiola-brinquedo-que-virava-tudo, a máquina de escrever, a cadeira de balanço (que balança de verdade como se o próprio estivesse presente), as esculturas trazidas da África.
Sacis e lobisomens
A ordem de visitação é livre, mas a reportagem do VIVER acompanhou a visita guiada pelo curador que optou por seguir, após vencer a “Babilônia”, pela trilha da oralidade: as parlendas são contadas por ciranda de bonecas (com feições inspiradas no trabalho do mestre escultura Vitalino, de Caruaru (PE); dois mamulengos trocam anedotas; e o boneco gigante de Olinda dá exemplos mnemônicos, ou formas verbais que quando associadas auxiliam na memorização: no caso a figura carnavalesca repete o nome dos dedos das mãos, listados como mindinho, seu vizinho, pai de todos, fura bolo e mata-piolho.
Saci, lobisomem, negrinho do pastoreio, mula-sem-cabeça e a lenda do boto, mais vídeos falando sobre os gestos, completam “a licença poética” da curadoria, que fez a parte da oralidade ser como se fosse um sonho de Câmara Cascudo.
 
Sabores
O módulo da dança se resume a um espaço oval com piso almofadado e iluminação berrante, cercado por um cortinado. A intenção da instalação, com trilha sonora composta por músicas do Carnaval, do São João e do ciclo natalino, é provar que o brasileiro é um povo musical e dançante: “Em qualquer paragem onde baterem uma batucada, tambor, pandeiro, cuíca, maraca, reco-reco, não faltará quem apareça bamboleando, riscando os pés, contraindo o ombro, seduzido, arrastado, possuído pelo batuque”, informa a frase de Cascudo ao lado do ambiente.
Na parte sobre fé e superstição, canteiros com ex-votos, imagens de santos e sal grosso. No meio, uma escada ornada por um gato preto que emite sons quando acionado pelos visitantes. É interessante perceber como as pessoas, religiosas ou não, evitam passar por baixo da escada.
A abordagem interativa sobre a alimentação será complementada com degustações semanais e debates. Ações extra paredes estão sendo planejadas em restaurantes de São Paulo com apoio do C5 – Centro de Cultura Culinária Câmara Cascudo, sediado na capital paulista. O circuito se fecha na varanda de Cascudo, com redes e paredes que aceitam rabiscos, recados e desenhos dos visitantes.
A exposição conta com patrocínio do Ministério da Cultura (via lei Rouanet), Petrobras, Governo de São Paulo, Grupo Marquise, Grupo 3 Corações e O Boticário.  
 
Fonte: Tribuna do Norte, Natal/RN, 21 de Outubro de 2015.
Ludovicus - Instituto Câmara Cascudo

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Visitação

O Instituto está aberto ao público de segunda a sexta-feira, das 9h às 17h.

Preço do Ingresso: R$ 10,00 (Inteira) e R$ 5,00 (Meia).

O agendamento prévio através do nosso WhatsApp ou endereço eletrônico é necessário para visitas de grupos.

O ingresso pode ser pago em dinheiro ou por meio eletrônico (transferência bancária ou PIX).

Visitantes com mais de 60 anos e menos de 7 anos são isentos do pagamento de ingresso.